Humildade de maranhense
Usando a tribuna o senador José Sarney discursou por mais de 30 minutos. Um amontoado de lamúrias acerca das idas e vindas da crise no senado, o encordoado de denúncias sobre nomeações de parentes, atos secretos, horas-extras pagas indevidamente e nomeação a rodo de diretores, etc, etc, etc…
O senador discorreu sobre sua longa ficha de relevantes serviços prestados à nação. Eximiu-se de qualquer culpa sobre os atos secretos afirmando que a crise é do senado e não dele.
Chegou a ser comovente ver uma figura daquela estatura, uma espécie de ex-tudo na política brasileira, rogando aos céus, com as mãos postas e espalmadas sobre o peito, sua honestidade ou seus pequenos erros. É uma injustiça do país julgar um homem como eu – afirmou. Confesso, quase fui às lágrimas.
Nomear um neto e uma sobrinha – que mora no Mato Grosso do Sul – para ser assistente parlamentar são pequenos erros, sem dúvidas. Mas para usar uma metáfora do futebol, ao gosto do presidente Lula, várias pequenas faltas fazem jus a um cartão amarelo. E o conjunto da obra um vermelho. Mas expulsar um atleta, nesse jogo que dura oito anos, é uma tremenda dificuldade. Quantos são os pequenos erros que estão acumulados nesse emaranhado – ou seria “maranhado” – de desmandos administrativos e políticos na trajetória desse senador do Maranhão?
Brasileiros e brasileiras. Era assim que o então presidente da república José Sarney se dirigia a povo em seus pronunciamentos. Numa época em que a inflação estava na casa dos 80% ao mês e o salário mínimo era de 40 dólares. Mas esses dados não estavam no seu arrazoado de relevantes serviços. Naqueles anos amargos havia 300 picaretas no Congresso e um fervoroso líder da oposição que afirmou que o Presidente da Nova República não faria a reforma agrária porque ele era um grileiro do nordeste. Mas os tempos mudam e o fervoroso líder da oposição se elegeu presidente e, do outro lado do mundo, afirmou que “Sarney tem história no Brasil suficiente para que não seja tratado como se fosse uma pessoa comum”. O problema do Brasil é justamente esse: Como são tratadas as pessoas comuns.
O sonho de todo brasileiro é ser tratado como senador. De minha parte abro mão dos atos secretos. A mim, bastaria ser tratado como um neto de parlamentar.
Há alguns dias o ministro Jobim falou que tinha costas de crocodilo e arrogância de gaúcho, concluo que o atual presidente do senado tem lágrimas de crocodilo e humildade de maranhense.
Athos Ronaldo Miralha da Cunha